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Caderno de Leitura, ano 2, n. 3 / Leituras LGBTQIA+
Ao Garoto do 950
Antonio Rodrigues Neri
Bem, desculpe se eu não sou tão bom assim com despedidas. Para ser
honesto, sempre tive medo do fim, em especial do nosso fim prematuro. Eu
te amei o Garoto do 950, eu o amei de uma forma tão intensa que até hoje
me pergunto como você nunca soube disso. O Garoto do 950, para mim, é
um rapaz muito inteligente,um adjetivo para ele: exato. Eu sempre tive
medo do fim, pois sabia que as pessoas costumam colocar pontos finais
quando cortam laços e eu não queria isso.
Um segue para cá, o outro para lá.
O caminho acaba sendo diferente.
Eu sei que é difícil. Eu não queria que você partisse, não queria que você
fosse para longe de mim. Queria ver vários filmes com você, irmos à praia,
passear no parque, beber centenas de cafés e te dar milhares de beijos,
mas sei que isso não vai ser possível. Contudo, essa é a primeira vez que eu
sinto que uma despedida não é sinônimo de ponto final.
Quando você chegou, Garoto do 950, eu aprendi que um pra sempre não,
necessariamente, dura uma eternidade. Durante aquele nosso abraço que
durou pouco mais de um minuto, você me trazia para próximo do seu
corpo com tanta vontade e com tanta força que me fez querer morar
naquela lembrança. Aquele beijo na testa. Aqueles toques sutis no meu
quadril. Suas mãos percorriam todo o labirinto da minha calça jeans que
estava quase grudada na sua, tamanha nossa proximidade.
Você me fez abrir os olhos para um mundo totalmente novo e possível, e
nesse novo universo comecei aprender coisas sobre a minha pessoa que eu
não sabia. Garoto do 950, você me tornou mais duro, mais resiliente a dor e
por tabela, me mostrou que às vezes o amor dói, machuca e vai embora
sem ao menos dizer adeus decente, se é que existe algum adeus que seja
decente.
Eu ainda me lembro de quando nos encontramos, ambos cheios de
cicatrizes e machucados, mas mesmo assim a gente meio que ficou junto e
eu te agradeço por ter ficado, mesmo que brevemente. Garoto do 950, por
mais exato que você seja, eu sempre vou preferir lembrar de você como
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Caderno de Leitura, ano 2, n. 3 / Leituras LGBTQIA+
alguém inexato, porque você era assim. Eu só não te perdoou por ter
sucumbido ao medo e preferiu seguir pelo caminho que machucou a
gente. Entendo que é difícil assumir um amor assim diferente, mas não
deveria, porque amor é tudo igual.
Garoto do 950, você me ajudou a colocar ordem nessa bagunça que eu
tinha dentro do meu peito e transformou num lugar lindo. Não sei se você
será um dos visitantes que ainda passarão por ele, mas se por alguma
ironia do destino nos esbarramos novamente, serei infinitamente grato de
te fazer inquilino e dessa vez, não passes só uma temporada.
Fonte: NERI, Antonio Rodrigues. Ao Garoto do 950. Texto cedido pelo
autor.
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